Este livro sobre o xadrez não tem uma única partida, mas sim uma batalha épica entre um americano e a máquina soviética que dominou o xadrez mundial.
O livro ainda não tem tradução em português, por isso as transcrições dos trechos que seguirão são por minha conta: “Bobby Fischer Goes to War”, de Edmons e Eidinow, com 350 páginas recheadas de entrevistas, pesquisa, relatórios, fotos, investigação, intrigas e depoimentos sobre o match de Reykjavik 1972, Fischer contra Spassky.
O livro tem como foco central os bastidores do “Encontro do Século” e paralelamente seus protagonistas. Desde a infância até o a conquista do título mundial.
Neste trajeto, me deparei com passagens curiosas, engraçadas e outras que demonstram o que os levou a se tornarem estrelas do esporte.
Também fiquei surpreso com a qualidade do trabalho dos escritores, que conseguiram deixar o livro acessível para não enxadristas. E o ritmo da narrativa consegue prender o leitor, que fica ansioso para saber o que vem a seguir na história.
E como apêndice, os autores trazem uma descoberta surpreendente. Após pesquisarem em arquivos da CIA e FBI, descobriram que a mãe de Bobby Fischer havia sido investigada pelas agências citadas por suspeita de espionagem. Vasculhando a vida dela não encontraram nada de definitivo, mas descobriram que o pai de Bobby Fischer era outro, em vez do pai de criação. E dão detalhes e provas que parecem conclusivas. Talvez seu nome real devesse ser Bobby Nemenyi, sobrenome do cientista húngaro que trabalhou no Projeto Manhattan para construção da bomba atômica americana em 1942. O pai oficial de Bobby, o alemão Hans Fischer teria rompido com Regina Fischer já em 1939. Bobby nasceu em 1943. Paul Nemenyi faleceu em 1952 e suas pesquisas e causas de morte seguem em sigilo. Fischer era vivo à época do lançamento do livro, mas não se manifestou sobre o assunto.
Cartas da mãe dele para uma amiga, encontradas um mês após a morte dele, relatam que Bobby havia rompido com a mãe por ela apoiar o regime comunista e por ele não saber ao certo sobre seu pai. Nestas cartas ela conta ainda que foi melhor para os dois que Bobby passasse a viver só aos 16 anos de idade, já que a presença dela o irritava.
Segundo Edmons, se Bobby ainda adolescente fosse a um médico nos dias atuais, talvez lhe diagnosticassem como possuidor da Síndrome de Asperger, que é um tipo de autismo caracterizado por não haver atraso na linguagem nem no desenvolvimento cognitivo, mas com dificuldades em interagir com a sociedade e com restritos e estereotipados padrões de comportamento e interesses.
Abaixo transcrevo alguns trechos selecionados:
"Eu (GM Bisguier) costumava visitar Bobby em seu apartamento todos os dias durante o Interzonal de Curaçao. Certo dia encontro o apartamento com a porta aberta e Bobby com um sapato na mão. Disse-lhe que com a porta aberta insetos tropicais iriam invadir seus aposentos. E ele respondeu: - É bem isso que eu quero!”.
"Poucos anos após a crise dos mísseis entre EUA e URSS, ocorrida em Cuba, iria acontecer o Memorial Capablanca em 1965 e Fischer fora convidado, mas o governo dos EUA nega liberar sua participação. Fischer então resolve jogar por telex. Cuba usa a participação de Fischer como uma vitória política. Bobby se irrita e avisa Fidel que não jogará mais se continuarem usando o nome dele para outros fins. Mas Fidel saiu-se muito bem dessa: 'Não existe necessidade de propaganda de vitória. Mas se você está assustado... então será melhor achar outra desculpa para não jogar' Fischer jogou”.
"Uma curiosidade misteriosa é o livro Die Blendung (Auto da Fé, na edição inglesa!), escrito por Canetti em 1935 (muito antes de Fischer nascer). O personagem central do livro era um enxadrista fanático chamado Fischerle, que sonhava em derrotar o campeão do mundo. Fischerle passava a maior parte de sua vida num tabuleiro e possuía potente memória além de um estilo furioso”.
"Spassky nasceu na época do Grande Terror de Stalin e logo depois suportou os ataques alemães a Leningrado até 1944. Cerca de 1 milhão morreram. Uma pequena parte pelas bombas, a maioria de fome e frio. Os sobreviventes mal tinham forças para enterrar os mortos e o canibalismo era endêmico. Korchnoi relata que provavelmente sobreviveu porque muitos de seus parentes morreram, deixando aos sobreviventes suas rações de comida”.
"Em meio às ruínas da cidade, o xadrez foi para Spassky sua conexão com a sociedade e o meio de manter o senso de ordem”.
"Aos onze anos Spassky era a salvação de sua família, recebendo salário maior que o de um engenheiro. A casa em que moravam tinha 14 metros quadrados, passando para 24 após a fama do menino. Nesta época, Spassky interrompeu por 15 minutos uma simultânea que dava, pois ficara abalado ao perder uma partida para um oficial, após permitir que este voltasse uma jogada".
"Aos 21 anos, Spassky precisava vencer Tal no Campeonato Soviético para se classificar para o Interzonal. Ele perdeu e chorou. Petrosian conta que, ao ir ver a partida, Spassky olhara para ele: - Eram olhos de um animal encurralado, lembra Tigran".
"Aos 22 Spassky se divorciara: - Éramos como bispos de cores opostas, disse”.
"No funeral de Keres todos se vestiam de preto, exceto Spassky, de vermelho. Havia milhares de pessoas na rua, mas ele era o único que podia ser visto, lembra Averbakh”.
"Após conquistar a coroa mundial, Spassky começou a dominar todos os aspectos da vida ao seu redor: - Ele até começou a dar conselhos de como cozinhar sopa! lembra sua esposa Larissa”.
"Não sei o que é pior: antes ou depois de um match pelo título mundial. Num match longo, o jogador vai muito fundo dentro de si mesmo, como um mergulhador. Então ele sobe à tona muito rápido. Não interessa se ganhei ou perdi o match, fico deprimido e não consigo me conectar com as outras pessoas. Eu quero é o meu adversário de volta! Somente após um ano a dor passa" (Spassky).
"Nunca quis ser campeão mundial. Só queria jogar bem xadrez. Nos últimos seis anos não tenho fumado e nem bebido. Meu médico me disse para ficar longe da excitação dos jogos de futebol ou hockey porque preciso dos meus nervos para jogar bem xadrez. Mas o que eu posso querer desta vida?" (Petrosian).
"O match Fischer x Petrosian foi jogado em Buenos Aires. Fischer aprovou a escolha, pois lá havia a melhor oferta financeira e os melhores filés”.
"Na primeira partida do match, Fischer inesperadamente entra na defensiva quando as luzes se apagam. O relógio é parado e Petrosian sai do palco. Fischer se afasta, mas segue olhando para o tabuleiro. Petrosian reclama ao árbitro que seu adversário segue calculando com o relógio parado. Fischer então pede ao árbitro que acione seu relógio, enquanto ele segue calculando na escuridão”.
"Durante o match contra Spassky, um repórter foi a 21 bares de Nova Iorque verificar se alguém seguia na TV a partida que era mostrada ao vivo. Dezoito dos 21 mostravam xadrez e somente 3 mostravam o jogo de baseball do NY Mets”.
"Após Fischer derrotar Spassky, o Comitê Soviético de Esportes reformulou suas bases para o xadrez no país, determinando mais educação enxadrística em geral, livrarias de xadrez para as grandes cidades com publicações estrangeiras e propostas para melhorar o treinamento e nutrição dos seus melhores enxadristas”.
Blog do Diconzi: http://rodrigodisconzi.blogspot.com
O livro ainda não tem tradução em português, por isso as transcrições dos trechos que seguirão são por minha conta: “Bobby Fischer Goes to War”, de Edmons e Eidinow, com 350 páginas recheadas de entrevistas, pesquisa, relatórios, fotos, investigação, intrigas e depoimentos sobre o match de Reykjavik 1972, Fischer contra Spassky.
O livro tem como foco central os bastidores do “Encontro do Século” e paralelamente seus protagonistas. Desde a infância até o a conquista do título mundial.
Neste trajeto, me deparei com passagens curiosas, engraçadas e outras que demonstram o que os levou a se tornarem estrelas do esporte.
Também fiquei surpreso com a qualidade do trabalho dos escritores, que conseguiram deixar o livro acessível para não enxadristas. E o ritmo da narrativa consegue prender o leitor, que fica ansioso para saber o que vem a seguir na história.
E como apêndice, os autores trazem uma descoberta surpreendente. Após pesquisarem em arquivos da CIA e FBI, descobriram que a mãe de Bobby Fischer havia sido investigada pelas agências citadas por suspeita de espionagem. Vasculhando a vida dela não encontraram nada de definitivo, mas descobriram que o pai de Bobby Fischer era outro, em vez do pai de criação. E dão detalhes e provas que parecem conclusivas. Talvez seu nome real devesse ser Bobby Nemenyi, sobrenome do cientista húngaro que trabalhou no Projeto Manhattan para construção da bomba atômica americana em 1942. O pai oficial de Bobby, o alemão Hans Fischer teria rompido com Regina Fischer já em 1939. Bobby nasceu em 1943. Paul Nemenyi faleceu em 1952 e suas pesquisas e causas de morte seguem em sigilo. Fischer era vivo à época do lançamento do livro, mas não se manifestou sobre o assunto.
Cartas da mãe dele para uma amiga, encontradas um mês após a morte dele, relatam que Bobby havia rompido com a mãe por ela apoiar o regime comunista e por ele não saber ao certo sobre seu pai. Nestas cartas ela conta ainda que foi melhor para os dois que Bobby passasse a viver só aos 16 anos de idade, já que a presença dela o irritava.
Segundo Edmons, se Bobby ainda adolescente fosse a um médico nos dias atuais, talvez lhe diagnosticassem como possuidor da Síndrome de Asperger, que é um tipo de autismo caracterizado por não haver atraso na linguagem nem no desenvolvimento cognitivo, mas com dificuldades em interagir com a sociedade e com restritos e estereotipados padrões de comportamento e interesses.
Abaixo transcrevo alguns trechos selecionados:
"Eu (GM Bisguier) costumava visitar Bobby em seu apartamento todos os dias durante o Interzonal de Curaçao. Certo dia encontro o apartamento com a porta aberta e Bobby com um sapato na mão. Disse-lhe que com a porta aberta insetos tropicais iriam invadir seus aposentos. E ele respondeu: - É bem isso que eu quero!”.
"Poucos anos após a crise dos mísseis entre EUA e URSS, ocorrida em Cuba, iria acontecer o Memorial Capablanca em 1965 e Fischer fora convidado, mas o governo dos EUA nega liberar sua participação. Fischer então resolve jogar por telex. Cuba usa a participação de Fischer como uma vitória política. Bobby se irrita e avisa Fidel que não jogará mais se continuarem usando o nome dele para outros fins. Mas Fidel saiu-se muito bem dessa: 'Não existe necessidade de propaganda de vitória. Mas se você está assustado... então será melhor achar outra desculpa para não jogar' Fischer jogou”.
"Uma curiosidade misteriosa é o livro Die Blendung (Auto da Fé, na edição inglesa!), escrito por Canetti em 1935 (muito antes de Fischer nascer). O personagem central do livro era um enxadrista fanático chamado Fischerle, que sonhava em derrotar o campeão do mundo. Fischerle passava a maior parte de sua vida num tabuleiro e possuía potente memória além de um estilo furioso”.
"Spassky nasceu na época do Grande Terror de Stalin e logo depois suportou os ataques alemães a Leningrado até 1944. Cerca de 1 milhão morreram. Uma pequena parte pelas bombas, a maioria de fome e frio. Os sobreviventes mal tinham forças para enterrar os mortos e o canibalismo era endêmico. Korchnoi relata que provavelmente sobreviveu porque muitos de seus parentes morreram, deixando aos sobreviventes suas rações de comida”.
"Em meio às ruínas da cidade, o xadrez foi para Spassky sua conexão com a sociedade e o meio de manter o senso de ordem”.
"Aos onze anos Spassky era a salvação de sua família, recebendo salário maior que o de um engenheiro. A casa em que moravam tinha 14 metros quadrados, passando para 24 após a fama do menino. Nesta época, Spassky interrompeu por 15 minutos uma simultânea que dava, pois ficara abalado ao perder uma partida para um oficial, após permitir que este voltasse uma jogada".
"Aos 21 anos, Spassky precisava vencer Tal no Campeonato Soviético para se classificar para o Interzonal. Ele perdeu e chorou. Petrosian conta que, ao ir ver a partida, Spassky olhara para ele: - Eram olhos de um animal encurralado, lembra Tigran".
"Aos 22 Spassky se divorciara: - Éramos como bispos de cores opostas, disse”.
"No funeral de Keres todos se vestiam de preto, exceto Spassky, de vermelho. Havia milhares de pessoas na rua, mas ele era o único que podia ser visto, lembra Averbakh”.
"Após conquistar a coroa mundial, Spassky começou a dominar todos os aspectos da vida ao seu redor: - Ele até começou a dar conselhos de como cozinhar sopa! lembra sua esposa Larissa”.
"Não sei o que é pior: antes ou depois de um match pelo título mundial. Num match longo, o jogador vai muito fundo dentro de si mesmo, como um mergulhador. Então ele sobe à tona muito rápido. Não interessa se ganhei ou perdi o match, fico deprimido e não consigo me conectar com as outras pessoas. Eu quero é o meu adversário de volta! Somente após um ano a dor passa" (Spassky).
"Nunca quis ser campeão mundial. Só queria jogar bem xadrez. Nos últimos seis anos não tenho fumado e nem bebido. Meu médico me disse para ficar longe da excitação dos jogos de futebol ou hockey porque preciso dos meus nervos para jogar bem xadrez. Mas o que eu posso querer desta vida?" (Petrosian).
"O match Fischer x Petrosian foi jogado em Buenos Aires. Fischer aprovou a escolha, pois lá havia a melhor oferta financeira e os melhores filés”.
"Na primeira partida do match, Fischer inesperadamente entra na defensiva quando as luzes se apagam. O relógio é parado e Petrosian sai do palco. Fischer se afasta, mas segue olhando para o tabuleiro. Petrosian reclama ao árbitro que seu adversário segue calculando com o relógio parado. Fischer então pede ao árbitro que acione seu relógio, enquanto ele segue calculando na escuridão”.
"Durante o match contra Spassky, um repórter foi a 21 bares de Nova Iorque verificar se alguém seguia na TV a partida que era mostrada ao vivo. Dezoito dos 21 mostravam xadrez e somente 3 mostravam o jogo de baseball do NY Mets”.
"Após Fischer derrotar Spassky, o Comitê Soviético de Esportes reformulou suas bases para o xadrez no país, determinando mais educação enxadrística em geral, livrarias de xadrez para as grandes cidades com publicações estrangeiras e propostas para melhorar o treinamento e nutrição dos seus melhores enxadristas”.
Blog do Diconzi: http://rodrigodisconzi.blogspot.com
Um comentário:
muito bom gostei muito pelo titulo que me vencer a curiosidade de saber por que o americano fischer e o deus da guerra e a parte que me mostro um verdadeiro campeao foi na parte que apaga as luzes e continua calculando e manta o arbritro acionar o seu tempo.parabens mario vaz pela traducao aprendi algo hoje valeu !!!
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