domingo, 31 de agosto de 2008

NA PRÓXIMA VEZ, VOCÊ PERDE, MAS ROCA!

Por: MI Nelson Pinal Borges

Com este artigo, desejo compartilhar com os aficionados amantes do Xadrez um interessante e instrutivo episódio do ex-Campeão Mundial José Raúl Capablanca que ouvi há muitos e muitos anos atrás do Mestre Nacional Francisco Planas. No mesmo, aprecia-se a fidelidade de Capablanca aos princípios fundamentais do Xadrez.

Antes de tudo, direi-lhes que o Mestre Planas foi parceiro de Capablanca na equipe que participou da Olimpíada Mundial realizada na Argentina no ano de 1939 e, por várias décadas, foi um dos melhores jogadores cubanos; foi capitão da equipe nacional que representou Cuba na Olimpíada Mundial de Havana em 1966. Como jogador, Planas se destacou por ser um excelente estrategista e um grande conhecedor dos finais; participou de Campeonatos de Cuba até início dos anos 70, quando a idade começou a enfraquecer seu nível de jogo. Posteriormente faleceu em 1990.

Bom conversador, de um caráter jovial e ameno, Planas foi muito querido pelos enxadristas de várias gerações e em geral por todos os que tiveram o privilégio de conhecê-lo e conviver com ele. (Pessoalmente tive a honra de ser seu discípulo por algumas semanas, quando, em 1968, esteve treinando a equipe de minha província, que interviria no Campeonato Nacional por equipes de 1968; posteriormente joguei com ele em dois Campeonatos de Cuba. Sempre levei em alta conta seus sábios conselhos.)

Pois bem, o episódio em questão aconteceu na Olimpíada de Buenos Aires, sendo seus atores principais Capablanca e Planas; ouvi-a do próprio Planas numa de suas costumeiras palestras com grupos de aficionados e mestres, que se deleitavam com suas exposições. Dito episódio é muito instrutivo e é uma mostra da importância que Capablanca dava à inviolabilidade dos princípios gerais do Xadrez, destacados pelo genial cubano em suas obras "Fundamentos do Xadrez" e "Últimas lições".

Numa das rodadas da Olimpíada, Planas foi derrotado em apenas 20 jogadas, depois de suportar um ataque ao rei no centro do tabuleiro (Planas não rocou).

Ao finalizar a rodada, a equipe se reuniu para analisar as partidas e Capablanca, aborrecido pelo resultado e, sobretudo pela violação de um princípio tão elementar como realizar o roque o mais cedo possível, perguntou ao perdedor - E você, por que não rocou?

-Não pude, não tive tempo!- respondeu Planas.

-Como não teve tempo? Mostre-me a partida! Disse-lhe Capablanca.

Assim, ao mostrar a partida a Capablanca, este, num momento da exposição, interrompe Planas e exclama:

-Alto! Agora, roque!

Os membros da equipe olharam Capablanca em silêncio, atentos para o que em realidade constituía uma lição. Mas todos se surpreenderam ainda mais quando Capablanca terminou a "lição" com uma repreensão:

-Na próxima vez, você perde, mas roca!

É de destacar que a Olimpíada de 1939 foi uma das últimas atuações de José Raúl Capablanca em sua brilhante carreira; defendeu o 1º tabuleiro da equipe cubana, que conseguiu classificar-se para a final, ocupando o décimo primeiro lugar, entre 15 finalistas. Em todo o torneio, Capablanca ganhou 7 partidas e empatou 9, melhor resultado que o do Campeão Mundial Alekhine, Keres, Tartakower, entre outros formidáveis mestres. Este desempenho valeu a Capablanca a medalha de ouro, a qual foi entregue pelo Presidente da República Argentina, diante de ampla manifestação de afeto e admiração de parte dos milhares de assistentes ao ato de premiação.

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