domingo, 19 de abril de 2009

O primeiro torneio internacional de xadrez

(por Pepelu)
Foto: Adolf Anderssen

O primeiro torneio internacional de xadrez da época moderna foi jogado em Londres no ano de 1851. O incentivador e principal interessado na realização do torneio foi o inglês Howard Stauton, considerado naqueles tempos como o melhor jogador de xadrez do mundo após ter vencido o francês Saint-Amant em 1834 na cidade de Paris.

A organização da competição levou cerca de um ano e o “endinheirado” clube de xadrez St. George se encarregou de convidar os melhores enxadristas europeus da época. Somente o russo Carl Jaenisch não pode participar. O torneio constituiu-se em uma autentica maratona enxadrística sendo jogado por eliminatórias. Na primeira fase foi uma “melhor de três partidas”. Na segunda e terceira fases, uma “melhor de sete partidas” e a final em uma “melhor de oito partidas”.

Adolf Anderssen, após esmagar Stauton por 4 a 1 na semifinal, fez o mesmo com Marmaduke Wyvill ao qual venceu por 4,5 a 2,5 na final, proclamando-se brilhantemente o vencedor do torneio. A vitória do prussiano foi uma autentica surpresa, pois foi o primeiro grande triunfo da sua brilhante carreira. Nessa época, Anderssen, era conhecido apenas pela composição de alguns belos problemas de xadrez.

É importante destacar que uma das mais famosas partidas de toda a história do xadrez, "A Imortal", foi jogada durante o transcurso deste torneio no dia 21 de junho de 1851. Trata-se de uma partida amistosa jogada entre Adolf Anderssen e o francês Lionel Kieseritzki, onde o genial prussiano sacrificou um bispo, duas torres e finalmente a dama!

A Imortal do Xadrez
Por Richard Guerrero

Anderssen, Adolf - Kieseritzky, Lionel [C33 – Gambito do Rei] 'Immortal game' London, 1851

1.e4 e5 2.f4 exf4 3.Bc4
Andersen se lança à aventura com esta interessante e arriscada variante do Gambito de Rei, que permitirá a Kieseritsky dar xeque com sua dama em h4, obrigando o rei branco a mover e perdendo com isso a possibilidade de rocar, porém com a contrapartida de que a dama negra não ficará bem colocada nesta casa e facilitará o desenvolvimento das peças de Andersen. A alternativa 3.Nf3 é mais freqüente.

3...Qh4+!?
No século XIX, os jogadores costumavam responder sempre à pronta saída do bispo branco com este xeque da dama. Posteriormente, passou a preferir-se a jogada 3...Nf6!? ; e inclusive 3...d5!?

4.Kf1
Evidentemente, era um suicídio jogar 4.g3 fxg3 5.Nf3 g2+! 6.Nxh4 gxh1Q+; e tampouco é possível aqui 4.Ke2, pois seguiria 4...Qg4+ 5.Ke1 (5.Nf3 Qxg2+) 5...Qxg2]

4...b5!?
A partida nem bem começou e ambos adversários já se puseram a jogar em plano selvagem! Kieseritsky não hesita em oferecer imediatamente o peão de vantagem, a fim de desviar o "terrível" bispo branco da perigosa diagonal que aponta a "f7" , enquanto aproveitam para facilitar o desenvolvimento de seu flanco de dama.

5.Bxb5
Como sabemos, nessa gloriosa época, todo o mundo aceitava um gambito, tanto com brancas como com negras, e quem não o fazia era tachado de covarde e de indigno, e ganhava o desprezo de todos seus rivais...

5...Nf6 6.Nf3
Agora podemos comprovar que a dama negra não ficou bem colocada e deve perder tempos em sua retirada.

6...Qh6
6...Qh5!? cravando o cavalo branco, parece mais apropriado nesta posição.

7.d3
Melhor seria 7.Nc3! reservando a possibilidade de jogar d4!

7...Nh5?!
Kieseritsky se lança ao ataque imediatamente e ameaça ganhar a torre de h1 com Ng3+!, porém é uma ameaça muito fácil de parar, e já sabemos que não é bom jogar várias vezes uma mesma peça na abertura quando ainda não se completou o desenvolvimento...

8.Nh4?
Uma rara forma de se defender da ameaça negra! Anderssen, com seu peculiar estilo, defende atacando e salta com seu cavalo a h4, com a idéia de depois saltar a f5 e fustigar, assim, novamente a dama negra. A idéia é boa, porém as negras também jogam! Melhor seria jogar 8.Rg1! com a idéia g4! Procurando explorar a cravada do peão f.

8...Qg5!
Kieseritsky ameaça, agora, simultaneamente o cavalo de h4 e o bispo de b5!

9.Nf5
Único lance para não perder peça.

9...c6?
E agora, o romântico russo deixa escapar uma boa oportunidade para ficar com uma clara vantagem jogando 9...g6! 10.Nd4 (10.h4 Qf6!; 10.g4? gxf5! 11.gxh5 fxe4) 10...Bg7! o que teria criado muitos problemas para as brancas.

10.g4?
E o selvagem Andersen (com o perdão!), nem breve nem simplista, volta a complicar a vida de maneira ruim, quando tinha uma jogada fácil: 10.Ba4! com bom jogo para as brancas.

10...Nf6?!
Nova imprecisão de Kieseritsky. Era muito melhor 10...g6! 11.gxh5 (se 11.Nd4 Bg7! 12.c3 Bxd4 13.cxd4 Qxb5 14.Nc3 Qb6 15.gxh5 Qxd4 com vantagem) 11...gxf5 com clara vantagem das negras; em troca 10...cxb5? 11.gxh5 ajudava evidentemente as brancas, ao abrir-lhes a coluna "g" para sua torre.

11.Rg1!
Alucinante! Andersen, ao lado do qual o General Patton podia passar por covarde, demonstra uma vez mais que os tinha muito bem postos! Passa, olimpicamente, por seu bispo ameaçado e defende seu peão "g" para buscar encerrar a dama negra. E há que dizer que, dadas as circunstâncias, é sua melhor opção, posto que do contrário as negras ficariam com uma cômoda e clara vantagem.

11...cxb5?Por incrível que pareça, as negras não deveriam capturar o bispo oferecido, e não porque lhes vá ficar encerrada a dama, senão porque, devido à captura, vai se desencadear um terrível e decisivo ataque das brancas, que vai pulverizar a posição das negras. Porém, quem podia prevê-lo neste momento? Nem Kieseritsky, nem nenhum outro jogador da historia do xadrez poderia ver tão longe! É absolutamente inimaginável. Por isso é tão maravilhosa esta partida! [se: 11...h5! 12.h4 (12.gxh5 Qxh5) 12...Qg6 e as negras teriam conservado uma ligeira vantagem]

12.h4!
Começa o assédio!

12...Qg6 13.h5! Qg5 14.Qf3!
Com a fortíssima ameaça imediata Bxf4, ganhando a dama negra.

14...Ng8
Kisieritsky abre o único caminho por onde pode retirar sua dama.

15.Bxf4 Qf6
Se 15...Qd8 se chegaria a uma ridícula e cômica situação das negras, na qual todas suas peças teriam voltado à posição de origem! Depois de 16.Nc3! o ataque branco "se jogaria só".

16.Nc3!
Apontando tanto a "d5" como a "b5"!

16...Bc5
Kieseritsky não encontra a defesa salvadora... porque não há! As negras tem muitas jogadas a escolher, porém nenhuma boa! Queriam, por exemplo, jogar a típica 16...Bb4, imobilizando o terrível cavalo branco, porém aqui o rei não esta em "e1"! E a jogada não serviria para nada.

17.Nd5!?
Mais contundente era 17.d4! com ataque "aplastante", já que não é possível 17...Bxd4 por 18.Nd5! e as negras perdem tudo!

17...Qxb2 18.Bd6?
Todos os comentaristas qualificam esta espetacular jogada de Anderssen de excelente e não hesitam em colocar dois sinais de admiração; porém, depois de analisar longamente esta posição, cheguei à conclusão de que é ruim! (lamentavelmente, já que gostaria que fosse boa!) Porque cheguei a uma clara refutação: 18.Nc7+! é em minha opinião o caminho que leva à vitória. 18...Kd8 (18...Kf8 19.Re1!) 19.Re1! Bxg1 20.Nxa8! recuperando a peça a menos (cai o bispo de "g1" ou o cavalo de "b8"!), e mantendo muito vivo o ataque ao rei rival.]

18...Bxg1 19.e5 Qxa1+ 20.Ke2 Na6 21.Nxg7+ Kd8 22.Qf6+ Nxf6 23.Be7# 1–0
Poderia dizer-se que esta partida tem muitos erros por ambos os lados, porém é inegável que é absolutamente espetacular! Me alegro de que Anderssen tenha jogado 18.Bd6 porque, do contrário, nunca teríamos podido desfrutar deste final tão maravilhoso.

sábado, 11 de abril de 2009

Curiosidade - Aberturas de Xadrez

Origem do nome da Defesa Francesa
A primeira referencia aos movimentos iniciais da defesa francesa foi realizada no livro de Luis Ramires de LucenaRepetición de Amores y Arte de Ajedrez”, publicado em Salamanca, 1497.

Neste livro Lucena se limita a mencionar que depois de 1.e4 e6, a melhor resposta para as brancas é 2.d4. Resposta que, apesar de haver passado quinhentos anos, segue sendo considerada como a melhor continuação para um grande numero de enxadristas.

A denominação de “Defesa Francesa” data do século XIX quando, em 1836, se celebrou um encontro postal entre o Clube de Xadrez de Paris e o Clube de Xadrez Westminster de Londres e os jogadores parisienses usaram a dita defesa com a qual conseguiram a vitória ao final do match.

Pierre C. F. de Saint Amant (1800-1872), um dos mais fortes jogadores de xadrez da época e famoso por seus encontros contra o inglês Stauton em 1843, assessorava aos parisienses, ainda que, George Walker (1803-1879), notável enxadrista e autor de vários livros de xadrez, fazia o mesmo com os jogadores londrinos.

Os jogadores do Clube de Xadrez de Paris elegeram a Defesa Francesa para evitar o jogo aberto característico do xadrez romântico daquela época. Desta forma, evitaram, por exemplo, as terríveis complicações do Gambito do Rei.

É de se destacar, também, que o famoso enxadrista francês Deschapelles (1780-1847) não quis participar do match justamente pelo fato de a defesa francesa ter sido eleita como arma defensiva, pois segundo ele a francesa era uma defesa maçante.

A Defesa Francesa sempre teve adeptos entre os principais jogadores de xadrez, incluindo entre eles os campeões mundiais Capablanca, Alekhine e Botvinnik.

Curiosidade - Os peões e as partidas de xadrez

(por: Pepelu)

Na continuação veremos um par de partidas surpreendentes
nas quais as brancas se impoêm de forma muito rápida, porém com a nota curiosa de que em ambas as partidas o vencedor realizou quase que tão somente lances de peões!

Borochow, Harry - Fine, Reuben [B03 - Defesa Alekhine] Pasadena, 1932
1.e4 Nf6 2.e5 Nd5 3.d4 Nc6 4.c4 Nb6 5.d5 Nxe5 6.c5 Nbc4 7.f4 e6 8.Qd4 Qh4+ 9.g3 Qh6 10.Nc3 exd5 11.fxe5 1-0


Kujoth - Fashing Bauer
[B20 – Defesa Siciliana] 1950

1.e4 c5 2.b4 cxb4 3.a3 Nc6 4.axb4 Nf6 5.b5 Nb8 6.e5 Qc7 7.d4 Nd5 8.c4 Nb6 9.c5 Nd5 10.b6 Qc6 11.Rxa7 1–0

O Sacrifício Posicional

Foto: Tigran Petrosian

Talvez não seja a parte do xadrez tático mais espetacular, mas a sua execução não é simples, pois exige um bom grau de cálculo e intuição posicional. Falo do sacrifício posicional, recurso muito utilizado na atualidade, que trouxe muitas conquistas para aqueles que se atreveram a fazer.

Para abordar esta questão, é lógico procurar o jogador que melhor dominava este recurso do jogo: Tigran Petrosian. Este artigo baseia-se em 3 partidas de Petrossian, um mestre da defesa, que através de sacrifícios posicionais conseguia escapar de situações complicadas. Essa é a idéia principal de um sacrifício posicional, alterar a dinâmica de uma posição em que não há qualquer vantagem ou iniciativa.

Partida nº 1

Reshevsky, Samuel - Petrosian, Tigran [E58 – Nimzo-India: Rubinstein] Candidates Tournament Zuerich, 1953

1.d4 Nf6 2.c4 e6 3.Nc3 Bb4 4.e3 0–0 5.Bd3 d5 6.Nf3 c5 7.0–0 Nc6 8.a3 Bxc3 9.bxc3 b6 10.cxd5 exd5 11.Bb2 c4 12.Bc2 Bg4 13.Qe1 Ne4 14.Nd2 Nxd2 15.Qxd2 Bh5 16.f3 Bg6 17.e4 Qd7 18.Rae1 dxe4 19.fxe4 Rfe8 20.Qf4 b5 21.Bd1 Re7 22.Bg4 Qe8 23.e5 a5 24.Re3 Rd8 25.Rfe1 Re6 26.a4 Ne7 27.Bxe6 fxe6 28.Qf1 Nd5 29.Rf3 Bd3 30.Rxd3 cxd3 31.Qxd3 b4 32.cxb4 axb4 33.a5 Ra8 34.Ra1 Qc6 35.Bc1 Qc7 36.a6 Qb6 37.Bd2 b3 38.Qc4 h6 39.h3 b2 40.Rb1 Kh8 41.Be1 ½–½

Diagrama 1 – posição após o lance: 25.Rfe1

Vamos dar uma olhada no Diagrama 1. Salta à vista que as brancas estão melhores. Contam com o par de bispos, algo de positivo para um futuro final. Mas acima de tudo conseguiram um perigoso par de peões centrais, um deles passado, o que lhe dá o controle completo da situação.

O principal problema para as negras reside no possível avanço do peão da dama para d5 (o que no momento não é possível) mas suas peças devem estar na vigia para não permitir isso.

Petrossian julgou que em tal posição, mais cedo ou mais tarde, acabaria por perder a partida por isso jogou 25...Re6 com determinação. A entrega da qualidade é amplamente compensada pela nova situação do peão em e6, que, por sua vez, permitirá ao cavalo alojar-se em d5. Isto irá desacelerar completamente os dois peões e as brancas irão enfrentar grandes dificuldades de manobra.

Diagrama 2 – posição após o lance: 29...Bd3

A situação resultante pode ser vista no Diagrama 2. O cavalo está muito bem colocado em d5, o centro foi fechado e Petrossian domina o flanco da dama.

A qualidade não tem qualquer utilidade para Reshevsky, algo que ele percebeu de imediato, e que o levou a sacrificar a torre pelo bispo apenas 3 jogadas mais tarde.

Uma tensa luta posicional com combinações de ambos os lados, terminou com um justo empate.


Partida nº 2

Petrosian, Tigran - Gligoric, Svetozar [E94 – Índia do Rei: Clássica] Varna ol (Men), 1962

1.d4 Nf6 2.c4 g6 3.Nc3 Bg7 4.e4 d6 5.Be2 0–0 6.Nf3 e5 7.d5 Nbd7 8.0–0 Nc5 9.Qc2 a5 10.Bg5 h6 11.Be3 Nfd7 12.Nd2 f5 13.exf5 gxf5 14.f4 exf4 15.Bxf4 Ne5 16.Nf3 Ng6 17.Be3 Qe7 18.Qd2 f4 19.Bf2 Ne5 20.Nxe5 Bxe5 21.Bd4 Bf5 22.Rf2 Bg6 23.Raf1 Qg5 24.Bxe5 dxe5 25.Kh1 Ra6 26.Bf3 Raf6 27.Re1 Nd3 28.Rfe2 Nxe1 29.Qxe1 Re8 30.c5 Rff8 31.Ne4 ½–½

Diagrama 3 – posição após o lance: 26...Raf6

A situação mostrada no Diagrama 3 é muito semelhante à do jogo anterior, mas a solução neste caso é um pouco diferente.

As negras contam com dois peões ameaçadores, e a idéia mais lógica parece ser a de levar o peão de d5 peão a d4, algo bastante provável.As brancas, por sua vez, estão amarradas e à mercê do que o seu adversário decida fazer.

Petrossian sabia que, mais uma vez, teria que “tirar algo da cartola” para se sair bem desta situação tão complicada. A solução foi oferecer uma torre por uma peça menor através da jogada 27.Re1, “presente” que Gligoric aceitou com prazer.

Diagrama 4 – posição após o lance: 31.Ne4

O Diagrama 4 mostra como o jogo terminou. Vemos como Petrossian usou suas peças menores para bloquear os peões negros, algo que Aaron Nimzowitsch concebeu no início do século XX.

Parece impossível que as negras possam atacar a fortaleza branca. Vejamos: o bispo defende o peão de g2, logo, por aqui não é possível. Talvez o seja atacar pela coluna h, mas parece pouco provável uma vez que as brancas controlam as casas h4 e h5 e, além disso, sempre existe o recurso do avanço h2-h3. Por outro lado, no flanco da dama existe uma superioridade de peões brancos, pelo o que as negras tiveram que se conformar com o empate ao intuir que seguir lutando, principalmente contra Petrossian, seria uma tarefa praticamente inútil.

Partida nº 3

Petrosian, Tigran - Sosonko, Gennadi [A01 – Abertura Nimzowitsch-Larsen] Interpolis Tilburg, 1981

1.c4 e5 2.b3 Nf6 3.Bb2 Nc6 4.e3 Be7 5.a3 0–0 6.Qc2 d5 7.cxd5 Nxd5 8.Nf3 Bf6 9.d3 g6 10.Nbd2 Bg7 11.Rc1 g5 12.Nc4 Qe7 13.b4 a6 14.Nfd2 f5 15.Be2 g4 16.Nb3 Kh8 17.Nca5 Nxa5 18.Nxa5 Qf7 19.0–0 c6 20.Nc4 Qe7 21.Rfe1 Bd7 22.Bf1 Nc7 23.Nb6 Rad8 24.Qc5 Qxc5 25.Rxc5 Ne6 26.Rxe5 Bxe5 27.Bxe5+ Kg8 28.d4 Be8 29.Nc4 b5 30.Nd6 Bd7 31.Rc1 Ng5 32.Nb7 Rc8 33.Bd3 Ra8 34.Kf1 Be6 35.Bf4 Nf7 36.Ke2 Bd5 37.Bxf5 Ne5 38.Bxe5 Rxf5 39.Nd6 Rff8 40.e4 Bc4+ 41.Nxc4 bxc4 42.Rxc4 a5 43.Bd6 Rfe8 44.e5 axb4 45.Bxb4 1–0

Diagrama 5 – posição após o lance: 25...Ne6

Nesta partida o sacrifício posicional não servirá para equilibrar uma posição inferior, mas sim para obter o triunfo em uma situação de igualdade.

Olhando o Diagrama 5 encontramos uma posição em que Petrossian não está melhor, as negras estão sendo mais incisivas e têm a iniciativa. Dominam o centro e têm boas perspectivas de ataque contra o roque.

Alguém como Petrossian compreende este tipo de posição apenas com uma olhada e sabe que, se quiser ganhar, terá que fazer algo para mudar a dinâmica da partida. Este algo foi trocar uma das suas torres pelo bispo e um peão negro.

Diagrama 6 – posição após o lance: 31.Rc1

No Diagrama 6 podemos ver o progresso de Petrossian. A cadeia de peões negros foi quebrada, e agora está sob controle; o bispo impede o avanço f4, e g3 não serviria de nada. Além disso, Petrossian eliminou o bispo bom das negras e conta com seu par de bispos, que se tornou poderoso pela grande quantidade de espaço que existe ao redor do rei negro.

As brancas também dominam o centro impedindo qualquer avanço das negras. Assim como o domínio das casas negras permite ao cavalo posicionar-se em casas interessantes, como d6.

Penso que todas estas vantagens sejam suficientes para compensar a qualidade entregue. As negras pouco podem fazer para deter a avalanche que virá.


Por estas três partidas podemos compreender por que razão era tão difícil vencer Tigran Petrosian, algo que lhe deu uma fama de jogador imbatível.

O sacrifício posicional pode ser um recurso salvador em posições que não temos qualquer vantagem ou até mesmo uma forma de obter a iniciativa em posições equilibradas. É um a mais na longa lista de sacrifícios de peça que podem ser realizados, embora não o mais bonito...


Tigran Vartanovich Petrosian
nasceu em Tbilisi no dia 17/06/1929 e morre em Moscou no dia 13/08/1984.

Os seus resultados no torneio trienal, que determinava o jogador que enfrentaria o campeão do mundo, demonstram uma sólida evolução: 5º em Zurique/1953; 3º em Amsterdã/1956; 3º na Iugoslávia/1959 e 1º em Curaçao/1962. Em 1963 derrotou o então campeão mundial Mikhail Botvinnik por 12,5 a 9,5 tornando-se Campeão Mundial de Xadrez.

Em 1966 Petrosian defendeu o seu título derrotando Boris Spassky por 12,5 a 11,5. Contudo, em 1969, o mesmo Spassky derrotou-o por 12,5 a 10,5. Em 1968, a universidade de Yerevan concedeu-lhe um mestrado, tendo Tigran apresentado a tese “Lógica no Xadrez”.

Petrosian foi o único jogador a ganhar um jogo de Bobby Fischer durante os últimos jogos do torneio de candidatos de 1971, acabando com a impressionante seqüência de Fischer de dezenove vitórias consecutivas (6 ainda nos jogos do agrupamento Interzonal, 6 frente a Mark Taimanov, 6 frente a Larsen e ainda o primeiro jogo do seu match).

O seu nome batiza duas importantes aberturas: a variante Petrosian na Defesa Índia do Rei (1.d4 Nf6 2.c4 g6 3.Nc3 Bg7 4.e4 d6 5.Nf3 O-O 6.Be2 e5 7.d5) e também na Índia da Dama (1. d4 Nf6 2. c4 e6 3. Nf3 b6 4. a3).

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Raios X

A força dos Raios X


Raios-X são radiações eletromagnéticas, invisíveis, capazes de atravessar corpos opacos e impressionar películas fotográficas.

Superman, um personagem da empresa DC tinha, entre outras habilidades, a capacidade de lançar raios através dos seus olhos, com os quais podia ver através de todos os tipos de estruturas para descobrir onde estava o “vilão malvado”, ou salvar pessoas inocentes em perigo.

Atualmente, com uma radiografia (raios X) podemos ver o grau de uma fratura em algum dos nossos ossos, assim como, nos aeroportos podemos controlar os objetos que passam que possam nos colocar em perigo.

Em resumo, raios-X nos permitem ver a estrutura dos corpos opacos, onde o olho humano não alcança.

No jogo de xadrez, o conceito de raios-X se refere a um tema enxadrístico que consiste na ação ou um ataque de uma peça em uma fileira, coluna ou diagonal, coberta por uma ou mais peças do lado oposto, onde a colocação dessas peças sobre o tabuleiro pode levar a situações vantajosas em jogadas futuras.

Os raios-X são enviados da mente do jogador projetando-se no tabuleiro visualizando a estrutura da posição, para analisá-la e encontrar casas débeis que possam ser atacadas mediante combinações das peças.

O que é a estrutura ou esqueleto do xadrez?
É a disposição das peças no tabuleiro e o seu efeito sobre nossas peças e nas do adversário.

Nada melhor para entender esses conceitos muito teóricos e, às vezes, abstrato do que um exemplo:


A posição ao lado corresponde à partida jogada entre Jose Miguel Fraguela Gil e Bent Larsen em Las Palmas, 1976. Analisemos os aspectos mais importantes da posição:

O roque branco está debilitado em virtude do avanço dos peões de g2 e h2.

A debilidade mais evidente, e que as negras irão explorar, é a casa f3.

O cavalo branco situado sobre a casa f3 é fraco, ainda que protegido pela dama em e3 e pelo bispo em e2, pois sem a sua presença a diagonal a8-h1 fica livre e aparecem possibilidades de xeque mate em g2 e h2.

Antes de jogar, o negro lança seus raios x e visualiza a seguinte posição:


A estrutura de peões é propicia para atacar pela diagonal com aa força da dama protegida pelo bispo de b7.

O cavalo apoiaria a incursão com seu salto até a casa f3 explorando esta casa fraca e provocando xeques que fariam com que o rei contrário ficasse mais exposto.

A configuração dos peões se torna exposta com os raios x, e, pelo fato de ser débil, propicia o ataque. Agora as negras têm que planejar como eliminar o cavalo branco de f3 para a diagonal se abra.

Neste este tipo de posição a agressividade das jogadas é vital para o êxito do ataque. Se necessário for, sacarificam-se pecas para provocar distrações ou pressionar sobre pontos débeis.

Assim sendo, Larsen fez a jogada que decide a partida e lhe deu a vitória: 26. ... Nd2!!

Na partida, Fraguela como bom jogador se rendeu, pois sabe que está perdido. Vejamos como teria continuado a partida e qual o cálculo que Fraguela efetuou para render-se de imediato:

26. ... Nd2 27.Qxe5 (27.Rc1 [27.Rd1 Ndxf3+ 28.Bxf3 Nxf3+ 29.Kf1] 27...Nexf3+ 28.Bxf3 Nxf3+) 27...Nxf3+ 28.Axf3 Qxe5 29.Axg7 Kxg7 30.Bxb7 h4 com vantagem decisiva para as negras.

As negras, além de ter vantagem material dispõem de peões em c, d, e, f que formam uma estrutura central muito superior. Abaixo a partida completa:

Fraguela Gil, Jose Miguel - Larsen, Bent [A10 – Abertura Inglesa] Las Palmas, 1976
1.Nf3 b6 2.b3 e6 3.Bb2 f5 4.e3 Nf6 5.Be2 Bb7 6.c4 a5 7.0–0 a4 8.d3 axb3 9.axb3 Rxa1 10.Bxa1 Bb4 11.Nc3 0–0 12.Na2 Bd6 13.Bc3 Nc6 14.b4 Ne7 15.Nc1 Ng6 16.Nb3 Qe7 17.Qd2 Ng4 18.g3 h5 19.c5 bxc5 20.bxc5 Bxc5 21.h3 Nf6 22.Nxc5 Qxc5 23.Bb4 Qd5 24.Bxf8 Ne5 25.e4 Nxe4 26.Qe3 Nd2 0–1